Aracruz: uma nova Macaé pode surgir no Estado - gazeta online
Aracruz: uma nova Macaé pode surgir no Estado Município é invadido por investimentos, mas também por problemas devido à falta de planejamento 11/06/2011 - 14h37 - Atualizado em 11/06/2011 - 14h37 A Gazeta Notícia Abdo Filho afilho@redegazeta.com.br (...) Aracruz recebe de um lado, só notícias boas. Investimentos chegando -
são esperados mais de R$ 3 bilhões nos próximos anos -, postos de trabalho
sendo abertos - a expectativa é de mais de 15 mil vagas até 2015 - e uma arrecadação que só faz crescer - o município espera por uma receita de R$ 285,1 milhões este ano, 24,3% a mais do que em 2010. Essa é a Pílula dourada de Aracruz, um dos polos de desenvolvimento do Norte do Estado, ao lado de Linhares e São Mateus. Veja que a população de Aracruz só aumenta, mas a qualidade de vida não: há mais crimes, menos casas e muitos problemas nas áreas de saúde e educação.
O problema é que essa mesma Aracruz convive com problemas típicos de cidades pobres, ou melhor, de cidades ricas que não sabem se aproveitar do desenvolvimento e obrigam seus habitantes a conviverem com o que há de pior quando o assunto é crescimento econômico acelerado. O exemplo-mor desta situação é Macaé, Norte do Rio de Janeiro, que, como sede da bacia de Campos, viu, da década de 70 para cá, sua receita crescer junto com os problemas causados por uma população que foi multiplicada por quatro em 40 anos. Desde então, a cidade fluminense, apesar de rica, é o símbolo de administrações caóticas, favelização, problemas ambientais e criminalidade alta. Aracruz, assim como a Macaé de duas três décadas atrás, vive um período de pujança econômica, puxada não só pelo petróleo, mas por uma forte atividade portuária, produção de celulose, entre outras. Nesse futuro promissor, os problemas começam. Em busca de uma espécie de eldorado, há uma intensa migração para a cidade que, somada à falta de infraestrutura urbana adequada, acaba fazendo surgir o pior parte do crescimento da economia. Mais gente Em dez anos, entre os censos 2000 e 2010, a população aracruzense cresceu 25,1%, de 64.637 para 80.864. Enquanto isso, no mesmo espaço de tempo, a população capixaba cresceu 9,5%. O efeito desse crescimento fora da curva já impacta no trânsito complicado, nas unidades de saúde lotadas, nas escolas sem espaços para mais crianças, na criminalidade crescente e na favelização. De acordo com dados de 2009 do Instituto Jones dos Santos Neves, Aracruz tem o segundo maior déficit habitacional do Estado, atrás apenas de Vitória. Pelas contas do instituto, há dois anos faltavam 1.432 unidades em Aracruz, hoje, a prefeitura já fala em 2,6 mil. Conflito social Essa conta inclui famílias que moram em invasões e nos bolsões de miséria que se espalham pela cidade. Há três semanas, a Polícia Militar colocou abaixo 313 casas construídas irregularmente num terreno em Barra do Riacho, região encravada no meio de indústrias e do Portocel. Quase um mês depois, 126 famílias continuam morando num ginásio da cidade. Algo parecido pode acontecer na Portelinha, comunidade, sem água, luz e esgoto, construída por migrantes como doméstica Marinalva Bernardes, nascida em Itapé, Bahia, que vive ao lado da nora e dos três netos. "Vim atrás de emprego, é a realidade de muitos por aqui. Meu filho morreu há três meses, rezo para ter saúde, só assim conseguirei trabalhar para manter a família". Para complicar ainda mais, denúncias de corrupção já deixaram a cidade por muito tempo sem comando. Prefeito desde 2005, Ademar Devens já foi afastado do cargo duas vezes acusado de fraudar licitações. Essa fonte de nebulosidade administrativa acaba travando as possíveis tentativas de avanço social. Macaé: exemplo que não pode ser seguido Macaé, Norte do Rio de Janeiro, é um exemplo a não ser seguido. Desde a década de 1970, quando a Petrobras escolheu Macaé para sediar sua sede na Bacia de Campos, a cidade deu um salto de crescimento. Mais de quatro mil empresas se instalaram no município e a população foi multiplicada por quatro - hoje são mais de 200 mil habitantes. Desde então, a cidade tornou-se um símbolo dos problemas gerados pelo crescimento desordenado, como favelização, falta de saneamento, problemas ambientais, índices crescentes de criminalidade e trânsito caótico. Na cidade rica, uma geração cresce sem pai No mesmo compasso dos problemas, meninas engravidam, e o pior: os companheiros vão sempre embora As lideranças comunitárias do município de Aracruz reclamam das condições do município diante de uma das melhores relações receita/contribuinte entre os 78 municípios do Espírito Santo: R$ 3.525,91 por pessoa. Para termos uma ideia, essa mesma relação em Vitória é de R$ 3.370,19 por habitante. Segundo eles, saúde, saneamento, segurança e habitação encontram-se em situação precária. Para eles, o principal motivador disso tudo é a migração, consequência do forte crescimento econômico vivido pelo município nos últimos anos. "Se você for numa unidade de saúde ou no hospital, encontrará sotaques de todo o Brasil. Além de não ter espaço para todos, a qualidade do atendimento, quando se consegue, não é nada boa. Se for algo mais complexo, tem de ir para Vitória", assinala Mário Camillo Neto, que, entre tantas outras funções na comunidade local, é membro da Câmara Estadual de Grandes Projetos. Júlio César Perini, líder comunitário de Barra do Riacho, conta o drama vivido pelas famílias da sua região. "São várias as adolescentes que já são mães. O pior é que os pais, em boa parte dos casos já foram embora, teremos uma enorme geração de sem pais em Aracruz". Ele também reclama da prostituição e do tráfico de drogas. "A prostituição e o tráfico de drogas invadiram o litoral de Aracruz de uma maneira assustadora". Na escola Caboclo Bernardo, única de ensino médio da região, a direção teve de se acostumar com essa realidade. Professores afirmam que são vários os alunos usuários de drogas. No quesito habitação, a situação também não é nada boa. Com a chegada de milhares de migrantes nos últimos anos, a cidade acabou ganhando verdadeiras favelas. O mecânico Rosenildo de Jesus, desempregado no momento, veio de Itaberaba, Bahia, há 13 anos. "Vim porque não tinha perspectivas por lá". Ele mora, junto com esposa e quatro filhos, a mais velha está grávida, no bairro Clemente e sofre com uma rua esburacada e com esgoto in natura passando na porta de casa. "A cidade é rica, mas oferece pouca infraestrutura. Sofro porque moro do lado de uma invasão (Portelinha), onde não há água, luz e esgoto". Um pacote de promessas para mudar a realidade Prefeitura reconhece os problemas, mas diz que a intensa migração é que deve ser combatida A Prefeitura de Aracruz reconhece os problemas vividos pelo município e garante estar trabalhando para resolvê-los. A chegada de milhares de novos moradores nos últimos anos é apontada como causadora dos gargalos estruturais da cidade. Secretário de Habitação e Trabalho em Aracruz, Davi Gomes afirma que o déficit habitacional da cidade é de 2,6 mil residências. "Muita gente chegou nesses últimos anos, a maioria sem emprego e em busca de um eldorado. Nos últimos seis anos construímos 900 casas, nos próximos 12 meses serão outras 570, mas mesmo assim o déficit permanece". Gomes, que também responde pelo Sine de Aracruz, diz que, para diminuir a migração, a ordem é dar preferência por contratar quem mora na região. "As empresas que chegam dão a preferência para os da região, mas o problema é que não podemos proibir a migração". As pastas de educação e saúde prometem um pacote de obras e contratações. "Vamos contratar médicos, ampliaremos algumas unidades e construiremos outras. Estamos com unidades funcionando pela metade por conta da falta de pessoal", destacou o secretário de Saúde, José Nazareno de Melo. Andrea Almeida, que responde interinamente pela Educação, também promete melhoras. "Construiremos e reformaremos escolas. Temos um plano para 2012 que inclui escola em tempo integral". Na segurança, a intenção é ampliar a quantidade de policiais militares na cidade e criar uma guarda municipal. Se sobra dinheiro, por que tanto equívoco? Faltam médicos, escolas decentes e um plano de moradia popular na cidade 1. Saúde A população aracruzense reclama da falta de vagas no hospital São Camilo, único da cidade, e nas unidades de saúde espalhadas pelo município. A foto acima mostra a fila de espera para a realização de pequenas cirurgias na unidade de saúde anexa ao hospital. Pessoas que há um ano esperam pela intervenção estavam na fila. Por falta de médicos, unidades que deveriam funcionar 24h, caso de Barra do Riacho, só funcionam de 8h às 18h. Grande parte dos atendidos na rede municipal são de fora da cidade. 2. Educação Vários colégios da rede municipal e estadual em Aracruz estão na mesma situação da escola municipal de ensino fundamental Zenília Varzem Ribeiro (foto acima), em Barra do Riacho. Com uma estrutura física precária, vide a situação do muro, a escola não oferece boas condições aos alunos. No mesmo bairro, a escola estadual Caboclo Bernardo, de ensino médio, está em reforma e, por isso, os alunos sofrem com poeira, barulho e só estudam por meio período. 3. Habitação Os alunos da Caboclo Bernardo não estão tendo aulas de educação física, porque o ginásio da escola está ocupado por 126 famílias despejadas de uma invasão há três semanas. Essas famílias fazem parte de um dos mais graves problemas de Aracruz, o déficit habitacional. Apesar de não ter, nem de perto, uma das maiores populações do Estado - são 80.864 -, o município, segundo dados de 2009 do Instituto Jones dos Santos Neves, possui o segundo maior déficit, atrás apenas de Vitória. Faltam 1.472 casas na Capital e 1.432 em Aracruz. Pelas contas da secretaria de Habitação de Aracruz, o déficit, hoje, já bate em 2,6 mil unidades. Análise: Os exemplos que não devem ser copiados Eneida Mendonça, Doutora em Arquitetura e Urbanismo Ocupação desordenada é uma terminologia que vem sendo utilizada para designar áreas urbanas sem infraestrutura, com habitações de padrão precário. No entanto, diversos estudos já demonstraram que nem todos os bairros pobres surgiram sem planejamento. Há também ocupações com moradias de alta renda e industriais, que, embora apresentem aparência ordenada, causam dano ambiental. A história recente do Estado, no que diz respeito à industrialização e de urbanização de sua Região Metropolitana, constitui-se em referência para analisar processos iminentes. O meio acadêmico e os institutos de pesquisa contam com vasta literatura, que pode permitir melhor desempenho em termos de desenvolvimento sócio-espacial. Temos aqui mesmo no Estado elementos de alerta. Um estudo sobre o processo ocorrido em Macaé pode também auxiliar a ponderar sobre o futuro de determinadas regiões do Estado e estimular decisões que viabilizem um desenvolvimento de alcance social. -- Enviado por Fabiano Dias Arquiteto-Urbanista
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