À sombra de Washington FMI BIRD Banco Mundial

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Tanto o Fundo Monetário Internacional quanto o Banco Mundial, encontram-se sob a estreita tutela do Departamento do Tesouro norte-americano. São as três partes decisivas do famoso Consenso de Washington
por Bernard Cassen
Há pouco mais de 50 anos, em julho de 1944, foram criadas as "duas instituições de Bretton Woods", a partir do nome de uma localidade no Estado de New Hampshire, nos Estados Unidos, que abrigou as negociações realizadas entre 44 países no âmbito da Conferência Monetária e Financeira Internacional das Nações Unidas. [1]
Meio século mais tarde, as missões dessas instituições nada têm a ver com as que originalmente lhes foram confiadas. A mudança reflete as mutações do meio econômico e monetário internacional e, principalmente, o crescimento vigoroso da ideologia neoliberal sob a égide de Washington, a partir da década de 80. Na verdade, tanto o FMI quanto o Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento (Bird) — sigla original do grupo que viria a ser o Banco Mundial [2] — encontram-se sob a tutela estreita do Departamento do Tesouro norte-americano, mesmo que contem atualmente com 182 membros cada. São as três partes decisivas do famoso Consenso de Washington. [3]] Formalmente multilaterais, as duas organizações defendem interesses unilaterais. Daí, a grave crise de legitimidade que atualmente as afeta.
As funções do FMIOs acordos de Bretton Woods instituíram um sistema fixo de paridade de moedas, e cada país signatário tinha por obrigação garantir a conversibilidade de suas divisas e defender a paridade — em ouro ou em dólares norte-americanos — dentro de uma margem de flutuação de 1%. Era o sistema do padrão ouro, que tomava por base a paridade fixa do dólar com relação ao ouro. A missão prioritária do FMI era controlar e gerenciar esse sistema, ponto de partida para a expansão do comércio internacional, considerado como motor do crescimento. Preocupados em abrir um máximo de mercados, os Estados Unidos queriam evitar qualquer veleidade de protecionismo numa Europa devastada pela guerra.
A segunda função do FMI consistia em conceder financiamentos de curto prazo aos países membros com déficits temporários na balança de pagamentos. O Banco Mundial tinha uma missão complementar: reconstruir as economias do pós-guerra através de empréstimos destinados ao financiamento de projetos de desenvolvimento. Num primeiro momento, os fundos do FMI e os empréstimos do BIRD foram quase exclusivamente utilizados pelos países europeus.
Os ajustes estruturaisDuas decisões norte-americanas iriam provocar uma reviravolta. Inicialmente, em 1948, o Plano Marshall, que substituiu o BIRD na questão da reconstrução da Europa, deixando-lhe basicamente o Terceiro Mundo como campo de ação; depois, em 1971, a decisão do presidente Richard Nixon de acabar com a conversibilidade do dólar em ouro, o que, dois anos mais tarde, iria levar à flutuação generalizada das moedas.
Privado de sua tarefa principal, o FMI concentrou-se na segunda: o financiamento dos déficits da balança de pagamentos e depois, a partir da década de 80, a reestruturação de economias muito endividadas, através de programas de ajuste estrutural. A única finalidade desses programas era garantir a quitação da dívida.
Uma maioria de oito votosA crise financeira da década de 90 (México, Tailândia, Indonésia, Coréia, Rússia, Brasil), que, contrariamente às precedentes, estava relacionada a créditos concedidos por agentes privados, consagrou o papel do FMI como "tábua de salvação" dos investidores, com seus "planos emergenciais" visando proteger os estabelecimentos financeiros dos países desenvolvidos, fazendo com que a fatura fosse paga pelos povos dos países onde tinham realizado seus suculentos negócios.
O FMI emprega 2,7 mil pessoas e o Banco Mundial, 8 mil; seus orçamentos são, respectivamente, de 575 milhões e um bilhão de dólares. As estruturas das duas instituições refletem a hegemonia dos países desenvolvidos [4] e, internamente, a dos Estados Unidos. Cada uma delas reúne 182 países cujos representantes constituem o Conselho Executivo. Mas, quer no âmbito do Conselho Administrativo, da Comissão Monetária e Financeira Internacional (do FMI), do Conselho Administrativo (do Banco Mundial) ou ainda da Comissão de Desenvolvimento, comum a ambas as instituições, as decisões são tomadas por apenas oito representantes (de um total de 24) que ocupam uma "cadeira" permanente, na seguinte ordem de direito a voto: Estados Unidos, Japão, Alemanha, França, Grã-Bretanha, Rússia, China e Arábia Saudita. Na verdade, a Rússia atualmente não desempenha papel algum.
Submissão por opçãoOs direitos de voto são fixados proporcionalmente às quotas-partes financeiras — espécie de "cotizações" pagas pelos Estados (ao FMI) ou a fração do capital subscrito ao Banco Mundial —, o que dá 17,87% de votos a Washington. Bastante longe de garantir a maioria, poderia pensar-se. Errado: as decisões importantes no FMI (que, com seu "selo de aprovação" dá luz verde a outras fontes de financiamento) requerem uma maioria qualificada de ?85%. Esse poder discricionário dos Estados Unidos jamais foi contestado pelos europeus. E no entanto, somente os membros da zona euro detêm, conjuntamente, 22,66% das quotas-partes, ou seja, 7,66% a mais que a minoria necessária para bloquear uma votação — mas jamais lhes veio à cabeça a id?
Bernard Cassen é jornalista, ex-diretor geral de Le Monde Diplomatique e presidente de honra da Atacc França.

[1] A Carta das Nações Unidas foi assinada um ano depois, em 26 de junho de 1945, e entrou em vigor em 24 de outubro do mesmo ano. Mas o termo Nações Unidas, cuja paternidade atribui-se ao presidente Franklin D. Roosevelt, já aparecia na "Declaração das Nações Unidas" de 1º de janeiro de 1942, em que 26 nações se engajavam a continuar juntas a guerra contra as potências do Eixo.
[2] Além do BIRD, o grupo do Banco Mundial compreende a Associação Internacional para o Desenvolvimento (AID) criada em 1960; a Sociedade Financeira Internacional (SFI), criada em 1956; e a Agência Multilateral de Garantia dos Investimentos (AMGI) criada em 1988.
[3] O FMI e o Banco Mundial têm sede na capital norte-americana. [voltar
[4] O diretor geral do FMI é tradicionalmente um europeu (atualmente o alemão Horst Köhler, que substituiu este ano o francês Michel Camdessus) e o presidente do Banco Mundial um americano (atualmente M. James D. Wolfensohn).
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