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Qual a relação entre as diferentes formas de produção de moradia com os tipos socioespaciais? O livro “Vitória: transformações na ordem urbana” parte de uma análise histórica para mostrar que a configuração socioespacial atual da RM da Grande Vitória tem o tipo Superior-médio habitando espaços de maior valor do preço do metro quadrado e mais verticalizados; o tipo Médio ocupando conjuntos habitacionais oriundos do BNH das décadas de 1970 e 1980; e o tipo Popular habitando edificações residenciais geradas por autoconstrução – sobretudo na periferia metropolitana.
A análise que correlaciona a configuração socioespacial com as diferentes formas de produção de moradia e os diferentes tipos socioespaciais é uma das contribuições inovadoras da equipe da Rede Nacional Observatório das Metrópoles para os estudos sobre os territórios metropolitanos.
O livro “Vitória: transformações na ordem urbana” traz no Capítulo 6 “Organização social do território e formas de provisão de moradia”, assinado pelos pesquisadores Latussa Laranja Monteiro, Marlon Neves Bertolani e Rodrigo Bettim Bergamaschi, o percurso histórico de provisão de moradia na metrópole do estado do Espírito Santo. Para isso apresenta a produção pública, marcante durante a fase de mais forte adensamento e constituição da aglomeração urbana da RMGV entre meados de 1960 e 1980 e a atuação mais recente da produção de moradias por meio do mercado imobiliário formal.
Além disso, são apresentados indicadores relativos a especificidades do estoque domiciliar, utilizando-se dos dados de domicílios dos censos IBGE relacionados às Tipologias Socioespaciais desenvolvidas pelo Observatório das Metrópoles.
Segundo Latussa Laranja Monteiro, os resultados apontam para uma produção de moradias que tende a reproduzir a dicotomia na ocupação entre espaços melhor infraestruturados e/ou litorâneos e aqueles mais do interior e/ou periféricos.
Provisão de Moradia na RMGV: 1970-2000
De acordo com o estudo, a Região Metropolitana da Grande Vitória se configurou como o espaço melhor infraestruturado do Espírito Santo - notadamente entre a década de 1970 e os anos 2000 – e que a metrópole capixaba foi o lócus da mais intensa oferta pública de moradias populares durante o período de maior aquecimento do setor, caracterizado pelo implantação de conjuntos habitacionais da COHAB-ES e também do INOCOOP-ES, que mostraram atuação forte até a extinção do Banco Nacional da Habitação (BNH).
No entanto, o estudo também aponta que toda essa intensidade não foi suficiente para atender numericamente ao crescimento populacional observado no mesmo período.
“A metrópole da Grande Vitória é onde surge e se fortalece também o setor da construção civil voltado à produção imobiliária, que inicialmente concentrou sua atuação em Vitória, a seguir em Guarapari e em Vila Velha, e constituiu os espaços ocupados pelo estrato mais elevado da tipologia socioespacial em 2010”, explica Latussa.
Os dados do Sindicato da Construção Civil no Espírito Santo apontam, por exemplo, que as regiões de mais elevados preços por metro quadrado e os espaços ocupados pelo tipo Superior-médio em 2010 são coincidentes. “Vimos que a verticalização primeiramente litorânea vem se expandindo aos municípios periféricos. Quando comparamos a espacialização do preço do metro quadrado e o mapeamento da tipologia socioespacial para 2010, percebemos essa relação no território”, completa Latussa.
O estudo aponta ainda que em função das condições de acelerado crescimento populacional e urbano, a RMGV mostra diferenças internas com relação a oportunidades habitacionais específicas: a ampla maioria do território, composta por edificações residenciais geradas por autoconstrução, onde estão os tipos Populares segundo a classificação socioespacial; as áreas ocupadas pelo tipo Médio onde estão localizados boa parte dos conjuntos habitacionais das décadas de 1970 e 1980; e o tipo Superior-médio, coincidindo fortemente com os locais de maior valor do preço do quadrado e mais verticalizados.
Segundo Latussa Laranja Monteiro, a análise mostrou que as áreas onde estão o tipo Superior-Médio são aquelas com melhores condições urbanas, ou seja, na correlação entre provisão de moradia e tipos socioespaciais se explicitaram as áreas com melhores qualidades para se morar. “O grande desafio para os atores governamentais é fazer com que a qualidade urbana localizada na cidade de Vitória e na região litorânea de Vila Velha se espalhe por todo o arco metropolitano. A qualidade dos indicadores (como IDHM e IBEU) verificados nas áreas ocupadas pelo tipo Superior-médio deve também ser levada para os outros espaços da região metropolitana”, afirma.
Programa MCMV na RM da Grande Vitória
Com relação à produção pública de moradia, sobretudo em se tratando do Programa MCMV, percebe-se que esta não consegue escolher sua localização na trama urbana da RM da Grande Vitória, ocupando os espaços que restam em suas franjas.
Segundo Latussa Laranja Monteiro, a periferização dos empreendimentos do MCMV pode ser constatada na necessidade de complementação da infraestrutura externa que não é paga pelo Programa Federal, por meio do IDURB-ES, ao complementar o valor de cada unidade para viabilizar empreendimentos em áreas dentro dos perímetros urbanos, mas ainda carentes de redes de abastecimento de água e coleta de esgotos, bem como de vias de acesso.
Essa informação é confirmada por Helena Zorzal, do Instituto de Desenvolvimento Urbano e Habitação do Espírito Santo (IDURB-ES), que participou da fundação do instituto em 2009 e trabalha desde a década de 1980 com o tema da habitação no estado. De acordo com Helena, não há uma política de habitação para o estado, mas sim programas que vão sendo utilizados para resolver as demandas.
O IDURB-ES tem tentado reverter esse quadro oferecendo ações estruturantes para a área. O programa “Nossa Casa”, por exemplo, com foco em habitação de interesse social atua nas lacunas do Programa MCMV oferecendo apoio aos municípios no tocante à infraestrutura urbana. “O MCMV é um programa habitacional, não uma política pública de habitação. E na minha opinião o programa tem limitações. Vejo a periferização dos empreendimentos como uma questão, gerada também pela dificuldade da aquisição de terras urbanas e regularização fundiária. O resultado são empreendimentos afastados do centro e sem infraestrutura. Esse é um ponto que precisa ser revisto”, aponta Zorzal.
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