hNão consigo imaginar movimento social mais importante hoje do que o de luta por moradia’
‘Não consigo imaginar movimento social mais importante hoje do que o de luta por moradia’
Marco Weissheimer
As ocupações de prédios e áreas públicas e privadas por movimentos de luta por moradia está expondo uma realidade dramática que a maioria da população ignora: o déficit habitacional que ainda faz com que milhares de pessoas vivam em condições extremamente precárias. O número de ocupações hoje em Porto Alegre é desconhecido pelas próprias autoridades. “Não conheço nenhum levantamento confiável. Há quem fale em 300 ocupações. Outros dizem que algo entre 20 e 25% da população da cidade está vivendo em áreas de ocupações. A Prefeitura fala em até 300 ocupações”, diz o promotor Cláudio Ari Mello, da Promotoria de Ordem Urbanística, do Ministério Público do Rio Grande do Sul. “Esse é um problema muito grande escondido em Porto Alegre”, acrescenta.
Em entrevista ao Sul21, Cláudio Ari Mello relata o trabalho que vem sendo realizado há pouco mais de dois anos pelo Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc), que busca soluções negociadas em processos envolvendo conflitos possessórios coletivos. O promotor também aborda as delicadas e tensas relações entre o direito à propriedade e a ideia de função social da propriedade, no contexto destes conflitos possessórios. E fala ainda sobre o desconhecimento da realidade da cidade por parte da maioria da população:
“Em geral, as pessoas não sabem o que está acontecendo na cidade. Quem mora em Porto Alegre não conhece a realidade de grande parte da população da cidade. Não sabe o que é viver numa ocupação, numa casa de uma ocupação, o que é ter água por mangueira, ter luz de gato, o que é viver vendo os filhos no meio do esgoto. Não tem a menor ideia. A tendência é tratar as ocupações como um caso de esbulho”, afirma o promotor que defende a importância dos novos movimentos sociais de luta por moradia que estão se espalhando pelo país.
Sul21: Porto Alegre, assim como tantas outras cidades brasileiras, vem lidando crescentemente com o tema do direito à moradia e das ocupações. Do ponto de vista legal, o Ministério Público é um dos atores centrais desse processo que afeta hoje a vida de milhares de pessoas. Como a Promotoria da Ordem Urbanística vem tratando esses temas?
Cláudio Ari Mello: A ideia de direito à cidade nasceu com um francês chamado Henri Lefebvre, na década de 60. De lá para cá, esse tema transitou especialmente entre aqueles que trabalham e refletem sobre a vida nas cidades: arquitetos, urbanistas, filósofos, sociólogos, antropólogos, ambientalistas, entre outros. Mais recentemente, esse título foi incorporado para refletir sobre questões que eram tratadas no âmbito do direito urbanístico. Desde a década de 60 também, se desenvolveu no Brasil uma área do Direito Administrativo que se chama Direito Urbanístico. Hoje, há uma espécie de convergência entre as reflexões mais abrangentes de urbanistas, filósofos, antropólogos e as dos juristas. Essa convergência tem modificado até a denominação do tema. Passamos a falar de direito à cidade. A promotoria onde trabalho se chama Promotoria da Ordem Urbanística, mas se fôssemos dar um nome bem contemporâneo a ela seria Promotoria da Cidade. (...)
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